O problema de se dar dinheiro a quem não trabalha são os riscos morais. Podemos mudar de sistema sem esses riscos?
A falta de dinheiro é um problema universal, mas também é verdade que se confunde falta de dinheiro com fatores emocionais. Aquilo que nos interessa hoje é justamente a questão moral das coisas.
Normalmente, são os pensamentos que determinam os sentimentos e estes dão lugar aos comportamentos.
Em termos práticos e simplistas a sequência é: pensamos que não estamos bem, com isso sentimos que somos infelizes e isso tem impacto no comportamento.
Nietzsche dizia que um sistema moral que fosse válido para todos era basicamente imoral. A razão é porque a vida das pessoas, a nossa vida, é o reflexo do ‘nosso grupo’ de iguais.
A ênfase está ‘no nosso grupo’ porque para o bem ou para o mal não somos todos iguais. Na escola pode ter-se eliminado a diferença entre os que sabem e os que não sabem, os políticos talvez procurem eliminar as diferenças na sociedade, mas a vida real é implacável e não tem piedade para com ganhadores e perdedores. Veja-se o futebol para não ir mais longe.
Mas voltemos aos riscos morais. Imagine que acrescentamos a esta situação das diferenças naturais… dinheiro.
O comportamento vai ser diferente? Para melhor, para pior? Esta é a questão moral do comportamento que pretendemos ver de forma mais clara apesar do exagero do exemplo. Foi propositado porque se exemplificássemos com um subsídio de prestação social para a inclusão, ou de desemprego, o leitor nem prestaria atenção porque fazem parte do nosso dia-a-dia.
Ora qual é o propósito destes subsídios? O que querem em troca, se é que querem algo em troca? Mas se não querem nada em troca porque será, se isso representa um esforço para todos aqueles que contribuem? Eu sei que já haverá gente a gritar solidariedade, mas recordo que o título deste artigo é: qual o problema de se dar dinheiro a quem não trabalha?
Mantendo o cepticismo natural de quem não tem certezas, diríamos que nenhum problema, se em contrapartida for pedido alguma coisa em troca que mantenha a moral das coisas e a justiça das coisas intactas, mesmo tendo em conta a solidariedade.
Não se pedindo nada como acontece agora, podemos ter comportamentos desviantes e, no mínimo, está-se a fazer concorrência desleal aos que trabalham, criando situações de injustiça.
Mas os factos não são animadores com a previsível futura crise das pensões, dos seguros de vida e da segurança social. Os média e os políticos têm por hábito falar dos problemas depois de acontecerem, nós gostamos de o fazer antes de acontecerem, e para isso nem é preciso ser adivinho.
Repare-se que a nossa segurança social está investida em dívida Portuguesa que está a pagar praticamente 0%, e os bancos remuneram os depósitos a zero. Já os fundos de pensões ou os seguros de vida têm o mesmo problema com a dívida Portuguesa, mas se optarem por dívida europeia, muita dela negativa, podem investir com a garantia de que vão perder dinheiro.
Talvez ainda ninguém se tenha lembrado, mas estas instituições que referi são instituições cujo capital reunido serve para pagar as reformas ou as pensões ou os seguros dos trabalhadores e, simplesmente, não vão ter activos suficientes para garantir as obrigações a que se comprometeram, a menos que se altere o paradigma.
Daí este nosso exercício de que vai ser necessário um banco central da Segurança Social para fazer um ‘bailout’ às pessoas, à imagem daquele que foi feito aos bancos e que, forçosamente, deverá ter em consideração as questões morais que não foram equacionadas no resgate dos bancos.
Certamente que sim, se tivermos em consideração que os atuais beneficiários estão efetivamente a ser beneficiados em relação aqueles que estão a pagar para um futuro beneficio, que não vão ter com estas regras. Existe risco moral para aqueles que aforraram ao longo da vida com o intuito de viverem agora melhor e não serem capaz de o fazer sem as remunerações que esperavam e que agora não podem ter.
Em 2008, estivemos à beira de precipício e desde então temos dado grandes passos em frente, sem alterar nada que possa mudar o rumo que seguimos.
Como se pode utilizar o dinheiro como influência positiva é a tese que defendemos desde 2008, com a criação de um novo paradigma económico criando um banco central da Segurança Social, sem riscos morais, em substituição dos actuais bancos centrais. Com o recuo, hoje já é possível reconhecer que se o dinheiro gasto tivesse servido para eliminar as dividas das pessoas, o problema dos bancos já teria sido resolvido.
O modelo experimental que vivemos actualmente não é sustentável. A filosofia actual dos bancos centrais faz do endividamento e da penalização dos aforradores a nova forma de opressão e de exploração existente.
A filosofia marxista fundada na luta de classes fez da opressão e da exploração a premissa para uma reflexão sobre a história. Segundo Marx, a desigualdade económica era necessariamente um sinal de injustiça, ora a desigualdade financeira extrema que se vive actualmente é também um sinal de injustiça e o que procuramos é também uma reflexão sobre a situação actual.
Que impacto tem esta actuação dos bancos centrais na liberdade das pessoas? Pode o dinheiro ser visto sem uma certa filosofia? Tem o dinheiro verdadeira importância para além daquele que nos é absolutamente necessário? Será o dinheiro uma coisa boa e será que aqueles papéis que o representam têm mesmo valor?
O objectivo de um banco central para a Segurança Social é garantir que todos se sintam com dignidade, mas talvez devam ter mais conhecimento para se poder ultrapassar a questão moral.
O objectivo desta reflexão é sugerir condições para evitar a próxima crise. Para evitar o que se aproxima é necessário um novo conjunto de regras. O colapso económico e financeiro não é um acontecimento, é um processo, e não creio que este facto seja correctamente entendido pela maioria.