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Confinamento Take 3: Vai Ficar Tudo Bem

  • Confinamento Take 3: Vai Ficar Tudo Bem

Hoje vamos falar de mercados…ou talvez não.

Euforias na bolsa e maus casamentos são sempre mais divertidos no início que no fim; a vida em Portugal parece seguir o mesmo caminho divertido, ao entrar no seu terceiro confinamento, apesar de ser o terceiro país mais endividado do espaço europeu, depois da Grécia e da Itália (ver Figura 1).

Apetece dizer: está tudo bem!

Figura 1

Em condições normais, os nossos credores poderiam ficar nervosos, caso o Banco Central Europeu (BCE) alterasse o seu programa de compras da nossa dívida; se o nosso PIB não crescesse conforme o projectado; se a recuperação prevista para 2021 não se materializasse.

Muitos dirão que não é previsível que tal aconteça.

O mundo agora mudou com o vírus; as agências de rating não têm a mesma importância de há anos; faz um ano que éramos um exemplo para a Europa, a nossa execução orçamental apresentava um superavit.

Tudo isto é verdade, mas é verdade também que estamos agora totalmente dependentes do BCE. Na realidade, o mundo ocidental está agora totalmente dependente dos bancos centrais.

Segundo o Banco Mundial, a presente realidade é a maior e mais rápida acumulação de dívida desde os anos 70.

Num sistema democrático, os cidadãos estão convencidos que uma mudança do sistema político sufragado por eleições resolve todas as situações e problemas, mas poucos se apercebem que a mudança de poder ocorreu de forma mais subtil, isto é, sem eleições.

Quando se está brutalmente endividado, como é o nosso caso, o sistema democrático depende de outro tipo de acontecimentos que não as eleições, e está sujeito a outro tipo de políticas que não aquelas decididas em voto pela maioria.

Esta outra estrutura de governo, na sombra, coexiste com o poder eleito, debate com chefes de estado e ministros das finanças, colabora com estes, traz auxílio em determinados momentos, como parece ser o caso, mas pode opor-se ou simplesmente decidir outra coisa se assim o entender.

Os políticos parecem querer acreditar que as actividades dos bancos centrais são exclusivamente técnicas, quase mecânicas e apolíticas.

Os detalhes são presumidos demasiado esotéricos para serem entendidos pela generalidade da população, sendo que o que é realmente importante é que o dinheiro chegue.

No entanto, as mais importantes decisões da política económica, incluindo quem pode prosperar ou quem deve falhar, são da autoria do banco central, apesar da opacidade que o envolve, em grande medida fruto do desdém da população e da classe politica em ter curiosidade sobre o seu escrutínio.

E se os bancos centrais decidirem não comprar mais dívida? E se…., são tantos os se’s, se nos dermos ao trabalho.

A história vista pelo prisma do dinheiro tem factos interessantes, permanentemente esquecidos por uma grande maioria e certamente não ensinados nas escolas. Por exemplo, a revolução norte-americana teve como importante motivo o Currency Act, ou seja a imposição do papel-moeda inglês, emitida pelo seu banco central, o Bank of England, nas Colónias Americanas.

Os colonos negociavam em moedas de ouro e prata cunhadas por outros países, ou simplesmente trocavam bens e não queriam ser pagos em papel dinheiro colonial que permanentemente desvalorizava – a verdadeira razão da revolta e subsequente independência dos EUA.

A crise do petróleo em 1973 tem um outro ângulo.

Em 1971, o padrão ouro foi substituído pelo padrão dólar, quando o preço estava a 35 dólares por onça. Em 1973, com o novo padrão dólar, o ouro estava a 100 dólares por onça. Em 1973 dá-se o embargo da OPEP. O motivo da crise foi política, mas o preço do petróleo acabou por se ajustar à realidade do novo padrão dólar, mas pelo nível do anterior padrão.

O dinheiro tem uma história que é contada com factos políticos, normalmente a versão dos vencedores.

Um outro exemplo de facto político é o Maio de 68: o movimento que ficou para a história como uma renovação de valores sem paralelo, com maior expressão sobre a cultura jovem.

O mesmo facto na versão do dinheiro está ligado à enorme pressão que o presidente De Gaulle exercia sobre outros países europeus, para que à semelhança da França exigissem a troca das suas reservas de dólares por Ouro.

Essa pressão tinha como finalidade forçar uma alteração do sistema monetário, aproveitando a fragilidade norte-americana que resultava das despesas estratosféricas com a guerra do Vietname, que os obrigava a desvalorizar o dólar em relação ao ouro – ou seja, aumentar o preço do Ouro (os outros países necessitariam de mais dólares para obter a mesma quantidade de ouro).

A alteração deu-se em 1971, mas reforçando ainda mais os privilégios dos Estados Unidos e eliminando totalmente a ligação ao ouro. A “coincidência” de 68, dá-se pouco depois do anúncio de De Gaulle de permitir a convertibilidade dos francos franceses em ouro.

Com o Maio de 68, esse facto tornou-se o calcanhar de Aquiles que fez cair a França perante os interesses anglo-saxónicos, que literalmente resgatavam os francos franceses em ouro e assim fragilizando as reservas de ouro francesas.

Todos temos opiniões sobre o mundo e os acontecimentos que nos rodeiam, isso é normal, mas é geralmente um exercício fútil, porque não temos nenhuma influencia sobre estes temas, somos meros observadores.

Em vários artigos, temos aqui pomposamente sugerido um novo sistema monetário, com o único intuito de sermos diferentes, apresentando uma solução para um modelo que está urgentemente necessitado de revisão, sob pena de criar maiores distorções.

Entretanto, estamos no confinamento 3, e tal como nos anteriores, os políticos identificaram o inimigo para justificar a sua intervenção; o inimigo é sempre o mesmo: as pessoas.

Estas, em resultado da sua forma desmazelada de viver não têm preocupações com o seu semelhante, nomeadamente os mais idosos. Esta velha táctica é muito conhecida: os políticos sabem perfeitamente utilizá-la para acalmar a plebe.

O facto de termos o maior número de população idosa na história da humanidade não parece ser importante. Como podemos observar na Figura 2, estamos a cometer um suicídio demográfico que ninguém comenta: nunca a proporção de idosos foi tão elevada (16,1%).

Desde 2004, a população activa está a diminuir todos os anos; em sentido contrário, a população com idade igual ou superior a 70 anos está a aumentar a um ritmo de 30 mil pessoas aproximadamente todos os anos!

Não interessa comentar que a 2 Janeiro de 2017 registaram-se 578 óbitos em Portugal em apenas um dia; na altura as temperaturas eram muito baixas, tal como agora.

Assim, registou-se um novo máximo no dia 12 de Janeiro de 2021: 651 óbitos em apenas um dia (fonte: DGS); no entanto, o número da população com idade igual ou superior a 70 anos subiu aproximadamente 120 mil!

Figura 2

  • Proteger esses idosos com lares aquecidos e pessoal qualificado, incluindo médicos e enfermeiros, não é uma opção.
  • Criar hospitais vocacionados para apoiar esta terceira idade em número crescente, não é uma opção.
  • Inovar, criando bairros ou aldeias com condições específicas e apoio social para os idosos que vivem sozinhos, de modo a ter mais capacidade de resposta organizada e permitir uma 4ª idade entre essa população, não é uma opção.
  • Promover e incentivar serviços de geriatria, tendo em conta o substancial e gradual aumento do envelhecimento da população, não é uma opção.
  • Convocar as nossas mentes mais brilhantes para estudar um plano global para este sector, não é uma opção.

Ainda não houve oportunidade, no entanto, neste grupo encontra-se mais de 90% das mortes por Covid-19. Basta uma coisa microscópica, como um vírus, ou uma onda de frio ou de calor, ou simplesmente o abandono a que são submetidos, para que as mortes aconteçam.

O confinamento parece ser mais facilmente entendível pela população e mais fácil de operacionalizar, e certamente reflecte melhor a nossa preocupação com os idosos.

Durante este confinamento, como solução teremos certamente mais estímulos, que é uma outra palavra para designar inflação; depois, continuaremos a ter idosos demasiado pobres para se reformarem, trabalhadores e empresas taxadas em demasia; e taxas de juro que continuarão a criar problemas aos aforradores e à rendibilidade dos fundos de pensões.

No final, o mais importante: Vai estar tudo bem!

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