Todos os dias, assistimos a acções concertadas dos bancos centrais. Estas politicas, que em função do nível actual das taxas de juro devem de ser cada vez mais coordenadas, provocam (pelo menos é o pensamento generalizado) a recuperação dos mercados, se não em alguns dias, certamente em poucas semanas.
O problema só irá colocar-se quando mais cedo ou mais tarde um acontecimento imprevisível surgir e, em vez de haver uma recuperação das cotações, haja uma nova quebra no mercado.
Nesse momento teremos o exacto oposto dos níveis actuais de falso optimismo e passaremos a ter pessimismo extremo, faz também parte da natureza humana. Pensamos que esse risco é muito real e é um perigo latente, porque os bancos centrais praticamente eliminaram os ciclos económicos e de mercado, e os participantes estão convencidos que estes deixaram de ser relevantes. Nada nos parece mais longe da verdade, vejamos um pouco de história:
O que nos revelam os anos 20 e 30 e os anos 80 e 90 para nos servir de guião para os anos 20 deste século.
As causas subjacentes aos processos de expansão e contracção monetária são sempre os mesmos, mas são os outros factores que fazem com que um ciclo de mercado pareça ser único. Esses factores, para além de acontecimentos específicos, são as taxas de crescimento, as taxas de juro e de crescimento monetário, que fazem com que qualquer projecção feita com base no passado esteja errada para o futuro.
Em 1920, no fim da primeira guerra mundial, a libra inglesa era a moeda internacional e o governo inglês por questões de prestigio tinha decidido voltar ao padrão ouro depois da primeira grande guerra.
No mercado livre, a libra tinha-se depreciado em relação ao dólar americano. Ao decidir voltar ao padrão ouro a libra passou a ter uma cotação irrealista, aliás manipulada, porque para isso convenceram o governador da New York FED a manter as taxas de juro americanas baixas para tornar o dólar menos atractivo.
A manipulação encontrada levou o Reino Unido a uma enorme depressão porque o país não conseguia exportar com aquele nível de valorização da moeda, e essa crise só acabou com a segunda guerra mundial.
No outro lado do Atlântico, o efeito da baixa das taxas de juro americanas, para manter a libra forte foi o aumento da massa monetária nos Estados Unidos.
O tal factor ‘’novo’’, as flutuações entre moedas, tinha criado uma nova correia de transmissão entre o dinheiro e os preços. Nos anos 80 mais precisamente entre 1982 e 1990 os Estados Unidos tiveram à época o seu maior ciclo expansionista apesar de a bolsa ter tido um crash em 1987.
No século XXI, a politica de taxas de juro zero levou ao maior aumento da massa monetária alguma vez vista. Tal como nos anos 20 e nos anos 80 do século passado, este excesso de liquidez foi canalizado para os mercados.
Nos anos 20 do século passado a rápida expansão da produção e as novas técnicas de produção levaram à multiplicação de produtos de consumo. Foi uma época de extraordinário aumento da produtividade.
Os anos 80 teve também um aumento da produtividade com a revolução informática dos computadores pessoais, mas os ganhos foram sentidos sobretudo pelos empreendedores e accionistas e não pelos trabalhadores com excepção do sector financeiro. Os ganhos de produtividade fizeram-se sentir sobretudo no Japão que se tornara a segunda potência mundial e credora dos Estados Unidos, enquanto os Estados Unidos passavam de país credor a país devedor, seguindo o padrão dos anos 20 quando o Reino Unido passou a ser devedor e os Estados Unidos credores.
Cem anos depois, os Estados Unidos têm a maior divida do mundo. Na realidade esta é maior que a divida acumulada de todos os outros países do mundo. Os grandes beneficiados deste ciclo são aqueles que estão mais perto do topo da pirâmide (os bilionários ou os 1%) e os consumidores de activos financeiros.
O que faz com que seja preciso muito mais divida para obter o mesmo ‘’output’’. O nível de rendimento horário de um trabalhador nos Estados Unidos quando transformado em ouro é o mesmo que auferia nos anos 70.
As similitudes são insuficientes para concluir que as épocas seguem padrões iguais, porque as forças motrizes são diferentes. Enquanto em 1920 se vivia o padrão ouro, os anos 80 começavam a estabilizar o fim do padrão ouro e o inicio de um sistema monetário com base em flutuações cambiais. Os anos 20 do nosso século estão perante uma nova realidade; a da planificação da economia através de uma politica de taxas de juro zero ou negativas.
Actualmente com a explosão de riqueza na Ásia e em particular na China, que passou a ser a fabrica do mundo, a economia dos Estados Unidos apesar de ainda ser a maior, deixou de ter a influência anterior e com isso deixou de determinar os ciclos económicos nas outras economias, e passou a sofrer a influência dos ciclos impostos por outras zonas económicas como a China0.
A cereja no topo do bolo tem sido a influencia da politica monetária da FED e de outros bancos centrais, como o BCE permitindo assim expandir o ciclo e retardar qualquer recessão.
Vejamos agora as taxas de juro. No padrão ouro dos anos 20 estas eram fixas, no sistema de câmbios flutuantes as taxas eram determinadas pelo mercado e agora elas são marcadamente controladas pelos bancos centrais.
No sistema de taxas de juro fixas, os bancos ficam com acesso aos depósitos dos clientes a muito baixo custo.
No sistema de taxas de juro determinadas pelo mercado, a divida publica é considerada ‘’divida sem risco’’ e a sua remuneração é o benchmark do dinheiro. A divida publica é considerada sem risco porque os governos podem sempre imprimir dinheiro ou taxar com impostos para pagar as suas dividas, sempre que o Estado possa emitir na sua própria moeda. Isto já não é verdade se tiver que emitir em uma outra moeda.
Desta forma, todos os outros investimentos têm um risco superior ao da divida publica, que nos Estados Unidos é o T-Bill ou T-Bond rate.
O problema coloca-se quando a taxa de juro chega a zero ou, como é agora o caso em muitos países, se torna negativa. O risco deixa de fazer sentido, porque não pode ser avaliado.
Os ciclos são sempre iguais e sempre diferentes mas o mundo tornou-se definitivamente mais complexo, porque este sistema monetário parece também ter chegado ao fim.